segunda-feira, 1 de junho de 2009

"Ficaram as canções e você não ficou..."

Ele pega todas as fichas e joga no chão. Não sabe que eu tinha planos mornos e pensamentos quentes em relação a nós dois. Ele põe a calça jeans, o tênis sujo e a mochila velha nas costas, se vira gritando planos, gritando sonhos, e esquece de me incluir neles. Não imagina que eu tinha ensaiado horas e horas uma proposta a fazer, e nela cabia o mundo dele também. Guardo tudo que eu repeti centenas de vezes para o espelho e me sinto meio ridícula. Vou ao mercado e coloco uma caixinha de lenços de papel em meio aos morangos. Os morangos, que agora eu vou comer só. Chego em casa e respiro fundo, tentando não achar o resto do dia tão desinteressante. Ponho a sacola ao lado das flores em cima da mesa. Ponho uma musica pra ouvir uma voz qualquer. Esqueço de trocar o CD, lembro que ele não vem.

Ele pega a cadeira e senta ao meu lado, como que sabendo que eu o quero ali. Ele me elogia a pele, o sorriso, e fala como se estivesse finalmente se deixando levar pelo meu olhar. Ele me olha, um olhar mais cretino ainda, e eu gosto disso. Segura a minha mão, diz que sente falta, sente saudade, sente vontade (muita). Eu acredito. Me encho de desejo, beijo de um jeito forte e tento não demonstrar o quanto eu sinto. Descemos pela rua sem gente, nos esbarrando em uma esquina ou outra. Andamos juntos, mas eu evito tocar as mãos, é perigoso demais. Fico sozinha na porta do prédio. Subo sozinha o elevador. Entro no banho, repito o CD, demoro um pouco mais. Espero o interfone tocar, o telefone tocar, mas adormeço em silencio. E o silencio dura tempo demais.

Ele me tem nas mãos e deixa escorrer entre os dedos. Me visita num dia frio em que bebi mais que duas taças. Lê umas palavras que escrevi, diz que são a minha cara e age como se me conhecesse bem demais. Mimetiza uma intimidade que me irrita por não ser de verdade. Vem chegando aos poucos e de repente não tenho mais espaço pra respirar. Tremo, mas não está mais frio. Esqueço por uns segundos a promessa que tinha feito a mim mesma, e quando lembro, já não tenho mais escolha. Ou tenho e escolho não pensar. A flor já está murcha e a geladeira vazia. O apartamento vazio. Ele tem que ir. Fico só, com as canções...

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