sábado, 3 de julho de 2010

Cinza

Não sei se é desinteresse ou medo o que me faz distanciar da minha própria vida. Mergulho em viagens para a Indonésia, me transporto pra uma Nova York antiga na pele de um adolescente em crise, viro uma detetive mamão-com-açúcar apaixonada pelo analista. Tudo para fingir que não sou eu. Quero um remédio que me faça ficar submersa, que paralise meus pensamentos, e encha de ar suficientemente meus pulmões até eu me sentir pronta. Chego a tremer sob a suspeita de qualquer barulho, mas silenciosamente sei que estou gritando por resgate. A verdade é que eu estou cansada de precisar que a salvação venha de fora, e dessa vez me voltei definitivamente pra dentro. Estou virada pelo avesso, enxergando meu coração se contorcer de desamparo. Desnutrida. Um véu cobre o meu corpo desolado, e com ele vou flutuando pelos dias sem fazer a menor diferença.

Eu costumava saber o que eu queria. Costumava acreditar nos outros, acreditar em mim mesma, mas tudo isso de repente se transformou num ceticismo rabugento e inabalável. Meu pincel só desenha tons de cinza, e nada mais cabe em mim, nem mesmo as promessas- as boas promessas. Não adianta falar comigo, meus ouvidos não querem ouvir – porque dói. Como alguém mais vai ter as respostas se nem eu mesma as tenho? Não quero mais o sereno, desisti de me expor a ele, mesmo sabendo da possibilidade de encontrar despretensiosamente lá no fim um cobertor e um céu com estrelas. Abdico temporariamente da esperança, enquanto espero que nada aconteça.

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